(Nota Política do PCB)
O Brasil vive hoje a continuidade da acirrada disputa observada no
segundo turno das eleições presidenciais, entre dois blocos defensores
do interesse do capital. Nesta disputa, surge uma proposta de
impedimento da Presidente Dilma. O PCB rechaça essa proposta que,
apresentada por forças reacionárias, não muda a essência do sistema e
não atende aos interesses históricos da classe trabalhadora.
Apesar de o governo do PT, PMDB e seus aliados ter cedido em muitas
exigências do grande capital e ter imposto os ajustes para satisfazer
ainda mais os banqueiros e rentistas, setores da direita derrotados nas
eleições de 2014 e parte da própria base aliada tramam para encurralar o
governo e arrancar ainda mais vantagens.
Nunca nos iludimos com o canto de sereia da institucionalidade
burguesa e sempre alertamos para o fato de o capital só respeitar a
chamada ordem democrática instituída enquanto lhe interessa, estando
sempre disposto a lançar mão de qualquer expediente inconstitucional
como golpes militares ou se aproveitar das brechas da legalidade
burguesa para promover golpes institucionais. Não acreditamos que o
núcleo duro do capital esteja insatisfeito com os governos
protagonizados pelos petistas. Mas pode ser que resolva acabar a
terceirização política que concedeu ao PT, no caso de instabilidade
política e econômica, já que este partido não oferece mais a vantagem de
administrar bem o capitalismo e, ao mesmo tempo, desmobilizar os
trabalhadores.
Esse quadro de debilidade do recente segundo governo Dilma é fruto
fundamentalmente do esgotamento do ciclo petista em função de sua opção,
em 2003, pela governabilidade parlamentar a qualquer preço, em
detrimento da sustentação popular, por parte dos trabalhadores e do
movimento de massas com vistas a mudanças estruturais. Como a
estabilidade dos governos petistas reside na administração do
capitalismo, o agravamento da crise desse sistema constitui o principal
fator da atual crise política.
Para esse caldo de cultura, contribuem a vitória apertada da
Presidente no segundo turno, a derrota eleitoral nos principais centros
operários, com diminuição da bancada do PT e consolidação de uma maioria
parlamentar conservadora, a perda de representatividade e combatividade
da CUT e de outras entidades chapa branca.
Essa instabilidade do governo alimenta sonhos golpistas no bloco de
oposição liderado pelo PSDB. Para o PMDB, favorecido como o fiel da
balança de todos os governos eleitos após o pacto de elites que pôs fim à
ditadura, esta situação instável oferece a possibilidade de um projeto
próprio de poder.
Por outro lado, a mídia destaca em primeiro plano os
escândalos da Petrobrás, para tentar privatizar ainda mais a gestão
desta hoje semiestatal e desgastar o governo para obter mais concessões
para o capital, passando a impressão de que a velha e sistêmica
corrupção inerente ao capitalismo foi inventada pelo PT que, em verdade,
manteve sem escrúpulos os esquemas que herdou.
Vê-se que o governo do PT está sendo vítima de duas de suas maiores
conciliações: com a mídia burguesa e com o atual modelo político. A
regulamentação e democratização da mídia e uma reforma política que
avançasse em espaços e instâncias de poder popular poderiam ter sido
implementadas na correlação de forças de 2003, antes de o medo vencer a
esperança. Além disso, o PT manteve o esquema da corrupção inerente ao
Estado capitalista, e desarmou ideologicamente os movimentos sociais,
com sua política de colaboração de classe.
O caminho escolhido pelo governo liderado pelos petistas foi o de
formatar um pacto social com a grande burguesia e acomodar frações
políticas de direita numa governabilidade sustentada pela troca de
favores, cargos no governo, financiamento de campanhas e emendas ao
orçamento. O resultado prático deste pacto foi o abandono das mínimas
reformas populares e do atendimento das demandas da classe trabalhadora,
ao mesmo tempo em que garantia as condições para a manutenção dos
lucros dos grandes monopólios. Optou-se por uma sustentação política
desmobilizadora, com base em programas compensatórios focados nas
expressões mais agudas da pobreza absoluta.
Agora que parte da direita que vinha garantindo sua governabilidade
ameaça abandonar o barco à deriva, ou buscar uma maior autonomia, e que a
oposição se move de forma mais direta e ameaçadora, inclusive nas ruas,
o governo se vê diante do desafio do equilibrista em cima do muro,
precisando, ao mesmo tempo, manter os ajustes e a política de ataque aos
trabalhadores e mobilizar os mesmos trabalhadores e setores sociais em
sua defesa.
O governo Dilma se debilita não apenas pelos ataques da oposição de
direita, mas também pelo oportunismo de setores do PT e do ex-Presidente
Lula, que antecipam a campanha eleitoral de 2018, procurando se
diferenciar da Presidente, pela esquerda, e mesmo desautorizá-la, no
intuito de credenciá-lo como crítico das duras medidas impostas contra
os trabalhadores. Apesar desse movimento para Lula parecer à esquerda de
Dilma, ele tem defendido publicamente os ajustes e as medidas de
austeridade, sob o argumento demagógico de que garantirão empregos.
Na verdade, o PT quer continuar a governar para a burguesia e pedir
apoio aos trabalhadores para não ser derrubado por ela. Mas o próprio
grande capital está no governo como fica claro pela nomeação de
ministros, a exemplo de Joaquim Levy, na Fazenda, Armando Monteiro, no
Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio, e a representante do
Agronegócio, Kátia Abreu, na Agricultura, e, mais do que isto, pela
política imposta nos últimos doze anos.
Ainda que acreditemos que o impedimento da Presidente seja uma
chantagem dos setores conservadores e do imperialismo para arrancar mais
vantagens de um governo enfraquecido, não descartamos a possibilidade
de a burguesia utilizar este instrumento, caso os desdobramentos ganhem
uma dinâmica negativa. Neste cenário, o governismo tenta se utilizar da
defesa da legalidade institucional para mobilizar os setores populares
em seu apoio. No entanto, a política econômica neoliberal que aplica é
contrária aos interesses dos trabalhadores.
Por isso, o PCB denuncia a chantagem do impeachment, mas não se ilude
nem concilia com o oportunismo governista, não se prestando a ser base
de manobra da campanha antecipada de Lula à presidência em 2018. Os 8
anos de governo do ex Presidente foram marcados pela sua rendição aos
interesses do capital e ao pragmatismo de partidos burgueses que
compuseram sua base parlamentar.
Além do mais, esta disputa entre PT e
PSDB se dá no campo da administração do capitalismo.
Desta forma, conclamamos os trabalhadores a se organizar e lutar para
garantir seus direitos ameaçados pelos ajustes anunciados pelo governo
da Presidente Dilma,
contra as mudanças nas regras do seguro
desemprego, contra os cortes nas áreas sociais, principalmente saúde e
educação, contra a política de superávits primários e os benefícios aos
empresários e banqueiros, pela reforma agrária e uma política agrícola
radicalmente populares, pela profunda transformação nas regras da
participação política visando à construção do Poder Popular.
Conclamamos aos movimentos sociais o resgate de sua autonomia
política e a construção de sua própria pauta, para a qual propomos:
-
Reversão imediata dos ataques à classe trabalhadora estabelecendo um
conjunto de direitos que a protejam da ofensiva do grande capital,
garantindo empregos, redução da jornada de trabalho sem redução de
salários, defesa dos salários contra a inflação e de ganhos reais,
enfrentamento à terceirização e precarização do trabalho;
-
Assumir o compromisso pela Reforma Agrária rompendo a submissão ao agronegócio;
-
Implantação de uma reforma urbana que reverta o modelo atual de
modernização das cidades em favor do grande capital, que tem produzido
expropriações e remoções em massa, e que seja capaz de enfrentar os
graves problemas urbanos de mobilidade, saneamento, acesso à cultura e
esportes e outros;
-
Demarcação imediata das terras indígenas e garantia das condições de vida das populações, em respeito às culturas específicas;
-
Imediata suspensão das chamadas medidas de austeridade que penalizam a
classe trabalhadora para salvar a política de transferência de recursos
públicos para o capital financeiro;
-
Defesa do Estado Laico, assumindo a defesa das demandas pela
legalização do aborto, pela criminalização da homofobia e pelo respeito à
pauta do movimento LGBT;
-
Reverter as privatizações, sucateamento do Estado e das Políticas Públicas pelo reinado das parcerias público-privadas;
-
Reverter o ataque à previdência social anulando a reforma da previdência;
-
Reestatização efetiva da Petrobrás e demais empresas estatais, assim
como a anulação das farsas que levaram à privatização das comunicações e
de empresas como a Vale e outras, recuperando a capacidade de um
efetivo controle das condições de organização da economia na perspectiva
popular e dos trabalhadores;
-
Anulação do Leilão do Campo de Libra e reversão da política de
partilha com o capital estrangeiro da exploração do Petróleo no Pré-Sal;
-
Apuração rigorosa da corrupção nas empresas estatais e punição dos
corruptos e corruptores envolvidos, com o confisco dos seus bens;
-
Uma profunda e radical alteração da forma política, com a adoção de
mecanismos de democracia direta, no sentido do Poder Popular;
-
A regulação e democratização da mídia; pela suspensão das concessões
públicas dos meios de comunicação a monopólios privados e imediata
execução das dívidas das grandes empresas de comunicação;
-
Fim da política de criminalização dos movimentos sociais e do direito
de manifestação impostas pela vigência da Lei de Segurança Nacional e
outros dispositivos legais autoritários;
-
Reversão da política nacional de segurança sustentada nos aparatos
das Policias Militares e no encarceramento que promove um verdadeiro
massacre da população jovem e, majoritariamente, negra nas periferias
das cidades brasileiras; desmilitarização da segurança pública;
-
Estabelecimento de uma tributação progressiva sobre grandes fortunas.
-
Retirada imediata das tropas brasileiras do Haiti; promover a solidariedade internacional classista e anti-imperialista.
O PCB seria o primeiro a se somar à defesa de um governo que
apontasse nesta direção. No entanto, o caminho do governismo é outro:
quer se servir das massas populares para legitimar um governo que vem
operando uma política contra os trabalhadores, comprometido de fato com
os banqueiros, o agronegócio, os monopólios industriais e comerciais e
com o imperialismo, o que tem ocorrido até agora.
Por todos estes motivos o PCB denuncia as ações das forças
reacionárias pelo impedimento da presidente Dilma como golpista e
hipócrita, mas não participará de nenhum movimento governista com o
objetivo de se legitimar perante os movimentos sociais apenas para
melhor negociar a continuidade de seu governo de pacto social com a
burguesia.
Estamos num momento significativo da luta de classes em nosso país:
enquanto os trabalhadores começam a perder a paciência e se reanimar
para a luta, a grande burguesia dá sinais de que não precisa mais da
terceirização política que concedeu ao PT, que já não tem o mesmo peso
social para desmobilizar as lutas de massa.
Os trabalhadores devem se preparar para qualquer cenário. Mais do que
nunca, faz-se urgente a criação de uma Frente pelo Poder Popular que
incorpore, na unidade de ação em torno de um programa comum, todas as
forças políticas e sociais do campo anticapitalista e anti-imperialista,
que construa uma efetiva alternativa de poder contra a burguesia e
aqueles que a ela se associam.
Lutar, criar, Poder Popular!
PS: Nota política de 15/03/2014
Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro (PCB)